quarta-feira, 12 de agosto de 2009

MILAN KUNDERA

A IMORTALIDADE

(1990)



1

A senhora poderia ter sessenta, sessenta e cinco anos. Eu a olhava de minha espreguiçadeira, recostado diante da piscina de um clube de ginástica no último andar de um prédio moderno de onde se via Paris inteira através de imensas janelas envidraçadas. Esperava o professor Avenarius com quem me encontro ali de vez em quando para discutir umas coisas e outras. Mas o professor Avenarius não chegavam e eu olhava a senhora; só, na piscina, imersa até a cintura, ela olhava o jovem professor de natação que, de roupão, em pé um pouco acima de onde ela estava, dava-lhe uma aula. Obedecendo a suas ordens, ela apoiou-se na borda da piscina para inspirar e expirar profundamente. Fez isso seriamente, com zelo, e era como se das profundezas das águas se elevasse a voz de uma velha locomotiva a vapor (essa voz idílica, hoje esquecida, só posso transmitir aos que não a conheceram, comparando à respiração de uma senhora de idade que inspira e expira na borda de uma piscina). Olhava-a fascinado. Seu ar cômico pungente me cativava (esse ar cômico, o professor de natação também percebia, pois os cantos de seus lábios pareciam tremer a toda hora), mas alguém falou comigo e desviou minha atenção. Pouco depois, quando quis voltar a observá-la, a aula havia terminado. Ela foi embora, de maiô, andando ao longo da piscina e quando já tinha ultrapassado o professor de natação aproximadamente uns quatro ou cinco metros, virou a cabeça para ele, sorriu, e fez um gesto com a mão. Meu coração apertou-se. Esse sorriso, esse gesto, eram de uma mulher de vinte anos! Sua mão tinha girado no ar com uma leveza encantadora. Como se, brincando, ela jogasse para seu amante um balão colorido. Esse sorriso e esse gesto eram cheios de encanto, enquanto que o rosto e o corpo não o eram mais. Era o encanto de um gesto sufocado no não-encanto do corpo. Mas a mulher, mesmo que soubesse que não era mais bonita, esqueceu isso naquele momento. Por uma certa parte de nós mesmos, vivemos todos além do tempo. Talvez só tomemos consciência de nossa idade em certos momentos excepcionais, sendo, na maior parte do tempo, uns sem-idade. Em todo caso, no momento em que se virou, sorriu e fez um gesto com a mão para o professor de natação (que não foi capaz de se conter e caiu na gargalhada), ela não tomava conhecimento de sua idade. Graças a este gesto, no espaço de um segundo, uma essência de seu encanto, que não dependia do tempo, revelava-se e me encantava. Fiquei estranhamente comovido. E o nome Agnes surgiu em meu espírito. Agnes. Nunca conheci uma mulher com esse nome.

(339 págs.)