sábado, 22 de agosto de 2009

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O Natal de um ladrão

A. T. Quiller Couch

Esperava que aquele negócio rendesse muito, pois o sr. Félix, o velho solteirão em cuja casa acabava de me introduzir, passa por ter consagrado trinta anos a adornar de boas coisas o seu gabinete. Qualquer nababo ou milionário pode dar-se ao luxo de colecionar; mas o sr. Félix, pessoa de modesta fortuna, devia ter feito uma escolha cuidadosa. Só devia ter comprado coisas de valor. E todas elas estavam dispostas dentro de lindas e pequenas vitrinas, com a as respectivas etiquetas e defendidas por fechaduras, que eu poderia ter aberto com um alfinete de cabelo.
A vitrina superior continha amuletos, mas disso eu nada entendo. A segunda, vinte ou trinta camafeus, sobre os quais eu projetava a luz da minha lanterna. Examinei cinco ou seis deles antes de os meter na maleta; reconheci Europa e o Touro; Ganimedes e a Águia; Agavé levando a cabeça de Penteu; Ícaro com as suas asas partidas, caindo de cabeça para o mar, aí representado por uma linha ondulada... Todas essas jóias eram de um valor inestimável.
Na terceira vitrina, havia uma esmeralda desmontada, digna de um resgate real, um broche com duas ametistas e um colar de pérolas negras. Tudo isso me demonstrava claramente que eu tinha de me haver com um artista que não amontoava coisas ao acaso, na sua coleção. "Que pena", pensava eu, "ver-me na necessidade de dar um desgosto a um homem tão inteligente!"
A quarta vitrina era reservada às miniaturas, quase todas orladas de diamantes. A quinta guardava as tabaqueiras: tabaqueiras de ouro, que ostentavam monogramas reais; tabaqueiras de concha de tartaruga e ouro; tabaqueiras de esmalte azul, incrustadas de diamantes. Duas destas, ao caírem juntas na maleta, chocaram-se. Esse ligeiro ruído fez-me estremecer, e detive-me um momento a olhar para trás.
A janela continuava aberta, tal como eu a tinha deixado. Fora, na noite calma e gelada, a neve dos telhados brilhava à luz clara do luar. Mas, embora não houvesse vento, a corrente de ar, que entrava pela janela aberta, havia avivado uma pequena chama na lareira, onde, três minutos antes, mal se via luzir o carvão. No andar de baixo, em algum salão afastado, os violinos tocavam uma valsa e um violoncelo marcava o compasso, pois o sr. Félix dava uma festa de Natal.

(275 págs.)

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