Pouco entendeu do texto, mas sentiu que estava diante de uma obra-prima. Algo de novo, ainda inexistente na França. Shakespeare o deslumbrava, mas chegara a hora de acabar com as representações das tragédias clássicas francesas. Queria ver no palco a explosão de todos os sentimentos, fazer a platéia prender a respiração ante uma complicada cena de amor ou de ódio. Faltava-lhe tão-somente um bom assunto. Haveria de encontrá-lo casualmente numa exposição de escultura em Paris, num baixo-relevo que representava o assassinato de Giovanni Monaldeschi, por ordem da rainha Cristina da Suécia.
Alexandre Dumas não sabia quem era Monaldeschi, tampouco ouvira falar na rainha, e, homem feito, foi obrigado a consultar a Biografia Universal, dicionário de personalidades históricas, para descobrir quem era Monaldeschi. Soube assim que hora o amante de Cristina da Suécia. Com ciúme dos favores dispensados pela amante a outro cavalheiro italiano, Sentinelli, Monaldeschi escreveu a Cristina uma série de cartas injuriosas, imitando a letra do rival. Descoberta a intriga, a soberana ordenou a seu novo amor que executasse Monaldeschi no pátio de Fontainbleau, presenciando o espetáculo. Munido dessas informações sumárias, escreveu o drama Cristina, que pretendia fosse representado no teatro mais famoso e exigente da época, o Comédie-Française.
Sabia das dificuldades que o esperavam. Coragem, orgulho, autoconfiança, entretanto, sempre foram os traços marcantes de seu caráter. Nada o intimidava.
Paris entrara em seus sonhos desde o dia em que chegara à sua casa certo Auguste Lafarge. Impressionaram-no a elegância do rapaz, sua loquacidade, seus versos e, sobretudo, a descrição de uma cidade de luzes e festas, onde a glória e o dinheiro pareciam fáceis.
Em Villers-Cotterêts Dumas pediu permissão à mãe para ir morar em Paris. Queria tentar o teatro. Confiando a um amigo o desejo de escrever uma peça e conquistar a fama, foi aconselhado a aprimorar sua cultura literária, ler muito, aprender vários idiomas, conhecer grandes autores estrangeiros antes de partir.
Aprendeu alemão e italiano sem muito esforço. Com a ajuda de Lafarge traduziu o romance Jacopo Ortis, de Foscolo, e leu Werther, de Goethe.
A certeza de que sua verdadeira vocação era escrever para o teatro fortaleceu-se quando um grupo de atores apareceu em Soissons, cidade próxima a Villers-Cotterêts. A representação de Hamlet, de Shakespeare, arrebatou Dumas.
Mais que a intricada análise de sentimentos e a inquietação revelada pelos personagens, encantaram-no a liberdade da construção dramática e o emprego de elementos grotescos.
Saiu do espetáculo convencido de que poderia criar algo igual ou melhor. Seu amigo Adolphe de Leuven, nobre sueco refugiado na França, frequentador habitual dos mais famosos teatros parisienses, ofereceu-se para colaborar, e ambos escreveram uma pequena peça em um ato: O Major de Strasburgo. Pouco depois Leuven voltou a Paris, onde morava, deixando o jovem ansioso por segui-lo e poder conquistar a capital.
A sra. Dumas não opôs resistência ao desejo do filho. Juntou o último dinheiro que lhe restava e fez-lhe as malas.
Alexandre chegou em Paris em 1822, com apenas vinte anos de idade, pouca instrução e nenhuma experiência. Precisava arrumar um emprego. Procurou Adolphe, em busca de três ou quatro endereços de ex-companheiros de seu pai.
Nem todos o atenderam. Um até duvidou de sua identidade, mas o último, o general Foy, o recebeu, lembrando com saudade o amigo desaparecido. Perguntou-lhe o que sabia fazer. Dumas disse-lhe honestamente que não conhecia matemática, ignorava por completo o que era álgebra ou contabilidade e não fizera curso de Direito. O general prometeu chamá-lo quando soubesse de alguma possível colocação. Ao ver, porém, a bela caligrafia com que desenhou o nome da rua e o número, teve uma ideia: o rapaz poderia trabalhar como secretário do duque de Orléans, futuro rei Luís Filipe. O emprego não só lhe garantiria a subsistência em Paris como também lhe haveria de abrir caminho para o Comédie-Française.
Todos os meses um funcionário do teatro ia levar entradas para o duque de Orléans, e, numa dessas ocasiões, Dumas resolveu interpelá-lo a respeito de como poderia fazer representar sua Cristina. O funcionário lhe esclareceu ser preciso submeter o manuscrito ao julgamento de uma comissão encarregada de leitura e aguardar o resultado. Alexandre não queria esperar nada. Sempre resolvera as coisas rapidamente, como com Catarina Labay, a costureirinha do prédio vizinho. Logo que a conheceu, tornou-a sua amante e teve um filho com ela antes que completasse um ano de namoro. Esse filho também se tornaria célebre: Alexandre Dumas, autor de A Dama das Camélias. Repentinamente chefe de família, teve de mudar-se para um apartamento maior, com Catarina e o menino.
Mas continuou tramando o meio de estrear no mundo do teatro. "O senhor poderá apressar as coisas", disse-lhe o funcionário, "se conseguir a mediação do barão Taylor", inglês nascido na Bélgica, naturalizado francês, amigo de Victor Hugo, comissário real do Comédie. Como fazer para entrar em contato com tão ilustre personalidade? Alexandre conhecera acidentalmente o escritor Charles Nodier, e graças a ele a leitura da peça foi antecipada. A comissão deliciou-se com aqueles cinco atos cheios de peripécias, ainda que não muito fiéis à verdade histórica. Vencera a primeira etapa. Restava-lhe outra, mais difícil: enfrentar a senhorita Mars, atriz principal do elenco permanente do Comédie.
Lidar com as mulheres de modo geral não o preocupava. Era um prazer e uma arte, na qual Alexandre era perito. Entre um verso e outro, envolvia-se num caso amoroso, apesar dos protestos de Catarina Labay. Com a atriz não deu certo. Velha, queria parecer moça. Educada na escola clássica, não queria saber de gritos nem de choros. Abominava o crime e o sangue apresentados em cena. Positivamente, não podia aprovar o que considerava de mau gosto no drama de Dumas. Ordenou-lhe modificações; ele se recusou a fazê-las e ela abandonou o papel. Romperam relações, tornaram-se inimigos. Cristina foi para a gaveta. Dumas no entanto, já havia posto os pés no Comédie.
Precisava encontrar logo outro assunto. Achou-o mais ou menos ao acaso, ao ouvir, durante uma conversa, um fato que ocorrerá no reinado de Henrique III. Marcado pela influência do escocês Walter Scott, que escrevia romances históricos após cuidadosas pesquisas, Dumas leu mais dois livros sobre o assassinato da bela duquesa de Guise por seu marido Henri ao ser surpreendida em adultério. Com mais alguns dados sobre a época, a sua fértil imaginação fez nascer uma peça cheia de colorido, de ambientação histórica, de emoção, que, se não chega a ser uma obra-prima, tem o mérito de haver iniciado o teatro romântico na França: Henrique III e Sua Corte, levada à cena pela primeira vez, no Comédie-Française, em 11 de fevereiro de 1829.
Além do sucesso, Alexandre Dumas levou, da estreia, o coração da jovem atriz Virgínia Bourbier e a alegria de ver presentes no espetáculo o duque de Orléans e toda a sua comitiva. Os direitos de imprimir Henrique III foram vendidos por uma soma assombrosa. Diante do êxito, retirou da gaveta Cristina, reescreveu-a, mudou-lhe o título (Estocolmo, Fontainebleau, Roma) e a fez representar. O triunfo foi absoluto.
Paris encontrava-se em plena ebulição cultural e política, em virtude das novas ideias que o Romantismo trouxera para todos os campos do conhecimento humano.
Alexandre Dumas não sabia quem era Monaldeschi, tampouco ouvira falar na rainha, e, homem feito, foi obrigado a consultar a Biografia Universal, dicionário de personalidades históricas, para descobrir quem era Monaldeschi. Soube assim que hora o amante de Cristina da Suécia. Com ciúme dos favores dispensados pela amante a outro cavalheiro italiano, Sentinelli, Monaldeschi escreveu a Cristina uma série de cartas injuriosas, imitando a letra do rival. Descoberta a intriga, a soberana ordenou a seu novo amor que executasse Monaldeschi no pátio de Fontainbleau, presenciando o espetáculo. Munido dessas informações sumárias, escreveu o drama Cristina, que pretendia fosse representado no teatro mais famoso e exigente da época, o Comédie-Française.
Sabia das dificuldades que o esperavam. Coragem, orgulho, autoconfiança, entretanto, sempre foram os traços marcantes de seu caráter. Nada o intimidava.
Paris entrara em seus sonhos desde o dia em que chegara à sua casa certo Auguste Lafarge. Impressionaram-no a elegância do rapaz, sua loquacidade, seus versos e, sobretudo, a descrição de uma cidade de luzes e festas, onde a glória e o dinheiro pareciam fáceis.
Em Villers-Cotterêts Dumas pediu permissão à mãe para ir morar em Paris. Queria tentar o teatro. Confiando a um amigo o desejo de escrever uma peça e conquistar a fama, foi aconselhado a aprimorar sua cultura literária, ler muito, aprender vários idiomas, conhecer grandes autores estrangeiros antes de partir.
Aprendeu alemão e italiano sem muito esforço. Com a ajuda de Lafarge traduziu o romance Jacopo Ortis, de Foscolo, e leu Werther, de Goethe.
A certeza de que sua verdadeira vocação era escrever para o teatro fortaleceu-se quando um grupo de atores apareceu em Soissons, cidade próxima a Villers-Cotterêts. A representação de Hamlet, de Shakespeare, arrebatou Dumas.
Mais que a intricada análise de sentimentos e a inquietação revelada pelos personagens, encantaram-no a liberdade da construção dramática e o emprego de elementos grotescos.
Saiu do espetáculo convencido de que poderia criar algo igual ou melhor. Seu amigo Adolphe de Leuven, nobre sueco refugiado na França, frequentador habitual dos mais famosos teatros parisienses, ofereceu-se para colaborar, e ambos escreveram uma pequena peça em um ato: O Major de Strasburgo. Pouco depois Leuven voltou a Paris, onde morava, deixando o jovem ansioso por segui-lo e poder conquistar a capital.
A sra. Dumas não opôs resistência ao desejo do filho. Juntou o último dinheiro que lhe restava e fez-lhe as malas.
Alexandre chegou em Paris em 1822, com apenas vinte anos de idade, pouca instrução e nenhuma experiência. Precisava arrumar um emprego. Procurou Adolphe, em busca de três ou quatro endereços de ex-companheiros de seu pai.
Nem todos o atenderam. Um até duvidou de sua identidade, mas o último, o general Foy, o recebeu, lembrando com saudade o amigo desaparecido. Perguntou-lhe o que sabia fazer. Dumas disse-lhe honestamente que não conhecia matemática, ignorava por completo o que era álgebra ou contabilidade e não fizera curso de Direito. O general prometeu chamá-lo quando soubesse de alguma possível colocação. Ao ver, porém, a bela caligrafia com que desenhou o nome da rua e o número, teve uma ideia: o rapaz poderia trabalhar como secretário do duque de Orléans, futuro rei Luís Filipe. O emprego não só lhe garantiria a subsistência em Paris como também lhe haveria de abrir caminho para o Comédie-Française.
Todos os meses um funcionário do teatro ia levar entradas para o duque de Orléans, e, numa dessas ocasiões, Dumas resolveu interpelá-lo a respeito de como poderia fazer representar sua Cristina. O funcionário lhe esclareceu ser preciso submeter o manuscrito ao julgamento de uma comissão encarregada de leitura e aguardar o resultado. Alexandre não queria esperar nada. Sempre resolvera as coisas rapidamente, como com Catarina Labay, a costureirinha do prédio vizinho. Logo que a conheceu, tornou-a sua amante e teve um filho com ela antes que completasse um ano de namoro. Esse filho também se tornaria célebre: Alexandre Dumas, autor de A Dama das Camélias. Repentinamente chefe de família, teve de mudar-se para um apartamento maior, com Catarina e o menino.
Mas continuou tramando o meio de estrear no mundo do teatro. "O senhor poderá apressar as coisas", disse-lhe o funcionário, "se conseguir a mediação do barão Taylor", inglês nascido na Bélgica, naturalizado francês, amigo de Victor Hugo, comissário real do Comédie. Como fazer para entrar em contato com tão ilustre personalidade? Alexandre conhecera acidentalmente o escritor Charles Nodier, e graças a ele a leitura da peça foi antecipada. A comissão deliciou-se com aqueles cinco atos cheios de peripécias, ainda que não muito fiéis à verdade histórica. Vencera a primeira etapa. Restava-lhe outra, mais difícil: enfrentar a senhorita Mars, atriz principal do elenco permanente do Comédie.
Lidar com as mulheres de modo geral não o preocupava. Era um prazer e uma arte, na qual Alexandre era perito. Entre um verso e outro, envolvia-se num caso amoroso, apesar dos protestos de Catarina Labay. Com a atriz não deu certo. Velha, queria parecer moça. Educada na escola clássica, não queria saber de gritos nem de choros. Abominava o crime e o sangue apresentados em cena. Positivamente, não podia aprovar o que considerava de mau gosto no drama de Dumas. Ordenou-lhe modificações; ele se recusou a fazê-las e ela abandonou o papel. Romperam relações, tornaram-se inimigos. Cristina foi para a gaveta. Dumas no entanto, já havia posto os pés no Comédie.
Precisava encontrar logo outro assunto. Achou-o mais ou menos ao acaso, ao ouvir, durante uma conversa, um fato que ocorrerá no reinado de Henrique III. Marcado pela influência do escocês Walter Scott, que escrevia romances históricos após cuidadosas pesquisas, Dumas leu mais dois livros sobre o assassinato da bela duquesa de Guise por seu marido Henri ao ser surpreendida em adultério. Com mais alguns dados sobre a época, a sua fértil imaginação fez nascer uma peça cheia de colorido, de ambientação histórica, de emoção, que, se não chega a ser uma obra-prima, tem o mérito de haver iniciado o teatro romântico na França: Henrique III e Sua Corte, levada à cena pela primeira vez, no Comédie-Française, em 11 de fevereiro de 1829.
Além do sucesso, Alexandre Dumas levou, da estreia, o coração da jovem atriz Virgínia Bourbier e a alegria de ver presentes no espetáculo o duque de Orléans e toda a sua comitiva. Os direitos de imprimir Henrique III foram vendidos por uma soma assombrosa. Diante do êxito, retirou da gaveta Cristina, reescreveu-a, mudou-lhe o título (Estocolmo, Fontainebleau, Roma) e a fez representar. O triunfo foi absoluto.
Paris encontrava-se em plena ebulição cultural e política, em virtude das novas ideias que o Romantismo trouxera para todos os campos do conhecimento humano.
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