quinta-feira, 14 de novembro de 2013

KEEP WALKIN', SENHOR WALKER!

"O Espírito-Que-Anda", "O Homem-Que-Nunca-Morre", "Guardião das Trevas Orientais"... são muitos os seus títulos; mas é como o primeiro personagem uniformizado dos quadrinhos que entrou para a História. Ele é o Fantasma, que completou 70 anos

Fantasma n° 259
by RGE
agosto de 1977

Por Thiago Rique

Tudo começou na manhã de 17 de fevereiro de 1936. Há mais de 70 anos, as HQs não tinham capas com efeitos holográficos nem eram impressas com luxo, e se limitavam a trazer apenas compilações, em papel barato, da fonte onde "nasciam": as tiras de jornais norte-americanos. Naquele dia, porém, os periódicos não trouxeram só animais falantes, marinheiros comedores de espinafre e detetives. Havia em suas páginas um personagem único, destinado a inaugurar um novo segmento de heróis: o Fantasma.

Ele era a nova criação de Lee Falk (cujo nome real, revelado recentemente, era Leon Harrison Gross) para o King Features Syndicate. Com apenas 24 anos, o jovem autor já fazia sucesso com o mágico Mandrake, criado dois anos antes. Mas o Fantasma era diferente de seu "irmão mais velho" e de todos os demais aventureiros de então, pois usava uniforme e máscara no combate ao crime. O que há de original nisso? Ora, na época não havia nenhum vigilante uniformizado nos quadrinhos!

O Espírito-Que-Anda, como também ficou conhecido, inaugurou a galeria dos "cuecas de fora", sendo seguido pelo Superman (1938), Batman (1939) e uma leva de tantos outros que copiavam o padrão de sua roupa ou a simples ideia do vigilante uniformizado.

Phantom (1962) 38-A
Comic Book by Gold Key
Jun 1970

O Fantasma não tem superpoderes (esse pioneirismo ficou para o último filho de Krypton), mas é ágil, calculista e sem-igual no combate corpo-a-corpo. Seu esconderijo e lar é a Caverna da Caveira, onde registra suas aventuras, vividas ao lado de seu fiel lobo Capeto e do corcel branco Herói. Sua maior arma contra os criminosos é a superstição (tem fama de ser imortal), além de estigmatizá-los com a temida marca da caveira, deixada pelo seu anel após nocauteá-los.

Mas o Fantasma não é imortal. Seu nome é Kit Walker e ele é o 21o. descendente de uma linhagem de defensores cuja história começou em 1534, nas remotas praias de Bengala, onde um navio mercante inglês foi atacado, pilhado e incendiado por piratas da Confraria Singh. Só um passageiro escapou da chacina: o primeiro Kit Walker, filho do capitão.

Harvey Hits 1-A
Comic Book by Harvey
Sep 1957

O jovem alcançou a praia e foi socorrido por pigmeus da tribo Bandar. Pouco depois, encontrou o corpo do assassino de seu pai e fez o famoso Juramento da Caveira sobre o crânio do criminoso, prometendo dedicar sua vida e a de seus descendentes a lutar contra a pirataria, crueldade e injustiça. A ideia do uniforme veio de uma divindade local.

Assim, o filho sucede o pai através dos séculos, criando a lenda do Homem-Que-Nunca-Morre. O "nosso" Fantasma realizou façanhas dignas de seus mais heroicos antepassados e figura como um dos mais valorosos membros da família. Em 1977, ele e Diana Palmer, sua amiga de infância, casaram-se e tiveram um casal de gêmeos, Kit e Heloise, a vigésima segunda geração da família Walker. Mas como nas HQs o tempo passa num ritmo mais lento, para os personagens passou-se apenas uma década, aproximadamente.

Nunca houve uma galeria fixa de vilões do herói, que enfrenta de chantagistas a feiticeiros loucos. Ainda assim, alguns inimigos ganharam destaque. Os Singh, adversários seculares dos Fantasmas, são os mais temíveis. O general Bababu, aspirante a tirano de Bengala, também causou várias dores de cabeça nas tiras e figurou como seu algoz numa minissérie publicada pela Marvel.

Invejável mesmo é sua galeria de grandes roteiristas e desenhistas. Lee Falk foi um fenômeno das tiras, escrevendo-as por simplesmente 63 anos, só parando em 1999, quando faleceu. Mas foi Ray Moore, seu antigo colaborador no Mandrake, quem desenvolveu o visual do Fantasma, definindo melhor suas feições e o uniforme, dando-lhe inclusive o famoso calção listrado. Depois dos dois, vieram nomes como Wilson McCoy, Carmine Infantino, Joe Orlando, Peter David, Steve Ditko, Jim Aparo, Sy Barry, George Olessen e, atualmente, Paul Ryan e Graham Nolan.

Em outras mídias, o Fantasma teve um seriado de cinema pela Columbia Pictures em 1943 e estrelou duas animações, Defensores da Terra e Fantasma 2040, esta última teve o desenho de produção feito por Peter Chung (Aeon Flux) e mostrava o 24o. Fantasma. O Espírito-Que-Anda chegou até a fazer uma ponta no desenho Yellow Submarine dos Beatles. Mais pop, impossível.

No entanto, não só de sucessos vive um personagem. O constrangedor filme O Fantasma, de 1996, com Billy Zane no uniforme roxo, foi uma sucessão de equívocos, mostrando vilões caricaturais, cenários pobres e afastando o público juvenil ao situar a trama nos anos 30.

Phantom (1988) 2-A
Comic Book by DC
Jun 1988

Foi nas versões para HQs que o herói realmente brilhou. No final da década de 80, a DC fez uma corajosa abordagem ao colocá-lo frente aos problemas econômicos e sociais da África moderna. E de 1994 a 1995, a Marvel lançou uma polêmica série na qual o Espírito-Que-Anda aparecia trajando equipamentos e indumentária high-tech.

Ainda assim, o Fantasma não emplacou nos Estados Unidos nas últimas décadas. Atualmente cabe à editora independente Moonstone a tarefa de publicar suas HQs por lá, com um sucesso modesto.

Por outro lado, o sr. Walker é imensamente popular em países como Suécia, Noruega, Austrália, Índia e Finlândia, muito devido à editora Egmont, que vem produzindo ótimas HQs há mais de três décadas, chegando a criar uma versão própria de sua mitologia, destoante das tiras em alguns pontos. Uma das últimas sagas editadas foi a aclamada Ano Um, produzida a diversas mãos para contar os primórdios de Kit Walker XXI como Fantasma.

Phantom: Ghost Who Walks (2009) 4-B
Comic Book by Moonstone
Jan 2009

Uma das maiores curiosidades sobre o personagem é o fato da cor do seu uniforme variar de país para pais. No Brasil, durante muito tempo, ele foi vermelho (como na Itália, na França e na Espanha). Pelo mundo, foi verde (Austrália), marrom (Nova Zelândia) e azul (Escandinávia). Isso porque não havia uma guia-cor a ser seguida. O que poucos sabem, contudo, é que a ideia original de Falk para o traje seria cinza e o personagem seria chamado de Grey Ghost (Espírito Cinzento).

No Brasil, após passagens pela RGE, Globo e Saber, o Fantasma é hoje editado pela Opera Graphica, que vem investindo no personagem desde 2001. Sua última aparição foi na revista Stripmania 3, mas a editora promete dois livros para comemorar mais um aniversário do personagem.

Last Phantom 9-A
Comic Book by Dynamite Entertainment
Jan 2011

Hoje, o Fantasma é publicado diariamente em 15 países. Passou pelo cinema, TV, games, foi transformado em bonecos, adesivos, estatuetas... Difícil nomear algo em que não teve seu rosto estampado. Afinal, o que nasceu naquela manhã de 17 de fevereiro de 1936, não foi só um personagem de quadrinhos, mas sim uma lenda... Uma das primeiras do século XX. A lenda do Fantasma de Lee Falk.

Thiago Rique jura que nunca viu o Fantasma, mas tem uma estranha marca de caveira do seu queixo.

WIZARD # 30 - Março de 2006 - Panini Comics.

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